Novo teste de triagem neonatal que “supera” o teste do pezinho já está sendo oferecido em maternidades brasileiras. Mas será que é mesmo importante?
 
Por Sabrina Ongaratto
 
Teste da bochechinha: é preciso fazer? (Foto: Pexels)
Teste da bochechinha: é preciso fazer? (Foto: Pexels)
Nos primeiros meses de vida, Lucca, agora com 1 ano e 3 meses, não crescia e nem engordava. Preocupada, a mãe, Julianne Guerreiro, passou por diversos médicos e uma bateria de exames para descobrir a causa. Mas o diagnóstico só chegou quando ela submeteu o filho ao teste da bochechinha. Resultado: Lucca tem Glicogenose Tipo 3 — uma doença que altera o metabolismo.
 
Hoje, ela conseguiu reverter o quadro do filho e controlar o problema pela alimentação. “Caso eu não o tratasse corretamente, ele poderia ter uma hipoglicemia, convulsão e até um estado de coma. Eu poderia perder o meu filho”, disse.
ENTENDA O TESTE DA BOCHECHINHA
No caso de Lucca, o teste da bochechinha foi fundamental para identificar e tratar a doença. O exame é novo — passou a ser disponibilizado em maio deste ano — e segundo o laboratório Mendelics, especializado em análise genômica, ele foi criado com o objetivo de complementar o teste do pezinho, ampliando a quantidade de doenças identificadas.
Enquanto o do pezinho — obrigatório e oferecido pela rede pública — é capaz de detectar 6 tipos de doenças, o da bochechinha chega a 287 doenças graves e silenciosas, como Glicogenose e Hemofilia. “Algumas dessas doenças podem ter consequências sérias, como a paralisia de membros e no pior dos casos, a morte. Quanto mais cedo puderem ser identificadas, maiores as chances de uma vida saudável”, afirmou o CEO da Mendelics, David Schlesinger. Segundo ele, o novo teste utiliza um algoritmo de inteligência artificial para acelerar e facilitar as análises, que em média, levam 20 dias para ser entregues. O exame está disponível apenas na rede privada e o valor é “salgado”, podendo custar de R$ 800 a cerca de R$ 1.200. 
NOVO TESTE: É MESMO NECESSÁRIO?
Segundo a geneticista e pediatra Patricia Salmona, do departamento de Genética da Sociedade de Pediatia de São Paulo (SP-SP), todas as doenças detectáveis pelo novo teste são raras e as principais ainda são as do teste do pezinho. “Uma das diferenças é a forma de coleta. Nesse novo teste, você não vai precisar de amostra de DNA do sangue, mas sim de algumas células da mucosa da bochecha, coletada através da saliva bucal — isto é, menos invasivo. Ele pode ser feito a partir do nascimento e não tem idade máxima para coleta”, explica.
Para a geneticista, apesar de bastante amplo, o novo teste não pode ser visto como um substituto para o teste do pezinho. “Primeiro, por causa do custo. Depois, por causa da baixa incidência de doenças raras, que é 4%. Então, em termos de saúde pública, ainda não seria uma opção”, afirma. A especialista ainda orienta que os pais não optem pelo teste sem antes conversar com um especialista que aixilie nessa tomada de decisão. “Ele é importante quando há necessidade, como em caso de suspeita de alguma doença. Além disso, é interessante que tenha indicação e seja acompanhado por um pediatra. Afinal, a interpretação de um exame que será entregue diretamente para família pode ter consequências e gerar preocupações desnecessárias”, alertou.
Patricia também lembra que o teste da bochecinha se trata de um exame de triagem, então, os resultados não “determinam” um diagnóstico final. “É necessário mais dados para finalizar o diagnóstico. Quando a criança nasce saudável e não apresenta nenhum sintoma, o teste do pezinho continua sendo suficiente”, finaliza.