Um bate-papo com Paul Lafontaine – idealizador do Instituto que ensina bateria a pessoas com deficiência e segue em campanha para reformar o espaço das aulas

O Instituto Alma de Batera já é um projeto de inclusão pré-adolescente, idealizado lá em 2008, por Paul Lafontaine, para ensinar bateria a pessoas com qualquer tipo de deficiência – física, intelectual, múltiplas.

Paul Lafontaine do Instituto Alma de Batera
Paul Lafontaine e Uriel | Foto: Marta Ayora

Durante esses 12 anos, Paul – que é baterista e pedagogo – sempre contou com o apoio de grandes bateristas do cenário nacional, convidados para as oficinas de estudo com os alunos.

Assim, as oficinas já contaram com bateristas como João Barone (Os Paralamas do Sucesso), Ricardo Japinha (CPM22), Paulinho Fonseca (Jota Quest), Bruno Graveto (Calirock, ex-Charlie Brown Jr), Daniel Weksler (Pitty e NX Zero), Cuca Teixeira, Douglas Las Casas, e Nina Pará, entre outros.

É importante salientar, no entanto, que não se trata de musicoterapia. Mas sim de um projeto que proporciona o primeiro contato com o instrumento aos apaixonados por bateria, com real interesse em aprender a tocar.

Baterista da banda CPM22 no Instituto Alma de Batera
Ricardo Japinha (CPM22) com o aluno Caio no Centro Cultural São Paulo

Essa foi a explicação do idealizador do Instituto Alma de Batera, em entrevista ao jornalista inclusivo, realizada em 2014, para o site Batera:

“Apostamos em exercícios básicos de bateria que estimulam o desenvolvimento global do aluno, incentivando seu potencial e habilidades, em atividades pedagógicas e dinâmicas corporais”.

Sem seguir uma linha com características terapêuticas, a realidade é que o Alma de Batera é tão importante quanto uma terapia, por diversos motivos:

  • Favorece a integração social;
  • Trabalha a desenvoltura para se expressar;
  • Aumenta a autoestima;
  • Melhora a coordenação motora;
  • Maior capacidade de raciocínio;
  • Facilita a capacidade de decisão;

O projeto, no entanto, está estrategicamente pausado desde o fim de 2018, segundo Paul, que tem se dedicado totalmente à parte administrativa do Instituto. Na “captação da Lei Rouanet e organização do plano de abrir um espaço próprio”, revela Paul.

Confira o bate-papo sobre a atual situação do instituto:

Logo do Instituto Alma de Batera
Acesse: almadebatera.org.br
Paul, naquela época, os alunos participavam de oficinas semanais de bateria no Centro Cultural São Paulo e na ADID (Associação de Desenvolvimento Integral do Down). E hoje, como está a questão do espaço do Alma de Batera?

“Em 12 anos de trabalho com o Alma de Batera, nós nunca tivemos um espaço próprio para poder receber os nossos alunos de bateria. Eu sempre sonhei em dar esse passo significativo com o Instituto, em ter um local só nosso, mas não poderia ser algo simples, sem suporte e nem estrutura. Já imaginou se eu simplesmente alugasse um lugar, colocasse uma bateria e saísse dando aula? Não é bem assim…. não quando se trata de bateria e muito menos quando se trata de inclusão, me referindo à questão de acessibilidade. Tudo tem que ser muito bem planejado e temos que pensar em todos os detalhes. O local precisa ser todo acessível e estruturado para receber os alunos da melhor forma possível, e isso acaba saindo com um custo mais alto.

Alma de Batera | Foto: Marta Ayora

Era um passo que precisava ser dado, para poder atender uma demanda maior de alunos interessados nas aulas, e também para conseguir que marcas e empresas se aproximassem mais e acreditassem mais, não só no trabalho que fazemos, mas principalmente no potencial de cada aluno. Para a nossa proposta crescer e impactar ainda mais a sociedade, é essencial ter esse espaço próprio! E esse momento chegou! Alugamos já um local na zona sul de São Paulo e agora estamos fechando parcerias com empresas para conseguir recurso necessário para a reforma, e assim, estabelecer o primeiro espaço no Brasil, específico para aulas de bateria para pessoas com deficiência.

Além dessas parcerias, sabemos que muitas pessoas que seguem o Instituto nas redes sociais, querem ajudar também. Então montamos a vaquinha para poder receber essa ajuda financeira dessa galera que acredita no nosso trabalho. Depois que acontecer a reforma, vamos abrir as matrículas para os alunos interessados e inaugurar esse lugar.”

Naquela entrevista, nossa conversa foi sobre a campanha de financiamento coletivo “Eu tenho Alma de Batera!”, que arrecadou recursos para abrir mais uma turma naquele ano, e para manter o projeto.
Hoje, no entanto, são outras questões: a campanha da “Reforma do Espaço Alma de Batera”, e a captação da Lei Rouanet. Explica pra gente.

“Naquela época, era uma outra fase do Alma de Batera. Tínhamos apenas 6 anos de vida e muitas coisas ainda para experimentar e vivenciar. Certeza que naquele momento, não passava pela minha cabeça em abrir um local e muito menos maturidade para arriscar algo nesse sentido. Meu foco ainda estava em consolidar algumas abordagens ali na prática com os alunos e assim, engajar mais pessoas à proposta.

Hoje com 12 anos, com o dobro de tempo e experiência, ter um espaço é crucial para estabelecer essa ideia e assim, futuramente, ampliar para outras cidades! E são duas frentes que precisamos de dinheiro: reforma do local e pagar toda a estrutura que envolve esse espaço como a equipe que irá trabalhar para o Instituto e gastos administrativos como aluguel, água, luz…..etc. E isso envolve muito mais dinheiro pois já é um passo maior do que 6 anos atrás. A vaquinha e a Lei Rouanet irão fazer desse nosso sonho, uma realidade!

Aliás, conseguimos pela lei Rouanet já 2 patrocinadores de peso para 2020: Rock In Rio e BASF! Cada empresa comprou uma cota proposta no projeto aprovado e ainda recebemos a doação de valores menores da Mercedes-Benz e da agência Red Door. Os recursos através da Lei Rouanet ainda estão sendo captados, e serão utilizados na manutenção da equipe de profissionais que irão trabalhar esse ano com a gente. São marcas muito fortes e que eu tenho muito orgulho de poder contar para o crescimento do Alma de Batera!”

Em 2014, para abrir novas turmas, também falamos em Lei Rouanet. Mas o atual governo impôs novas regras para a Lei de Incentivo à Cultura. Diante disso, quão essencial seria essa captação para o Instituto poder se manter?

“Sinceramente, para os trabalhos culturais pouco conhecidos e com dificuldades em captar recursos como o nosso caso, essa mudança até favoreceu nessa questão de oportunidade. Hoje, existe uma chance maior das empresas colaborarem com ideias que não estão tão em evidência com o público em geral. Mas independente de quais regras teremos que seguir, qualquer forma de captação é essencial e necessária para uma instituição sem fins lucrativos se manter. Vivo essa realidade todo dia e já faz parte pensar em diversas formas de captar mais dinheiro para conseguir pagar as contas.”

Então vamos à prática! Explica pra gente, como é o processo de aprendizagem dos alunos, e como essa experiência os ajudam no dia a dia?

“Cada um tem seu processo de aprendizagem, tem sua forma de entendimento e sua forma de chegar ao resultado, para tocar bateria. Difícil explicar aqui como se dá o processo de todos os alunos do Alma de Batera pois existe uma diversidade enorme de perfis e uma infinidade de formas de se passar o conteúdo da aula. Minha principal preocupação como professor é a de como vou me conectar com meu aluno ali na hora, antes mesmo de passar alguma informação. Sem essa conexão com o aluno, o processo de aprendizagem não tem um ponto inicial.”

O Instituto recebeu o Selo Referência Nacional, desenvolvido pela ANEC para reconhecimento da classe empreendedora.

“É aí que está o segredo de se trabalhar com o ser humano, independente se ele tem uma deficiência específica ou não: a conexão.”

“Essa conexão ou ligação, é essencial para entender quais as necessidades básicas do aluno, para que assim, depois que as mesmas forem atendidas, a gente poder realmente trabalhar com conteúdos que tragam resultado na bateria. Trabalhando dessa forma, o aluno consegue não só enxergar uma perspectiva de tocar um instrumento musical, mas levar esse empoderamento para outras atividades. Desperta nele uma força que tudo se torna possível! É claro que alguns alunos já trazem isso com eles, e damos uma fortalecida nisso. Mas tem outros que descobrem essa força com as nossas aulas e transformam-se para viver uma vida totalmente diferente do que viviam. Para nós que vivenciamos esse processo de cada aluno bem de perto, é algo muito valioso e recompensador!”

Além do real interesse em aprender a tocar bateria, quem pode participar do Instituto Alma de Batera, e o que precisa fazer?

“Queremos aquelas pessoas apaixonadas por bateria, que tenham alguma deficiência e que por conta de sua condição, não conseguem uma oportunidade na sociedade de aprender o instrumento. Muitas pessoas perguntam: ‘Ahh…mas vocês só atendem pessoas com deficiência?’ Sim, queremos nos dedicar integralmente para esse público alvo, buscando sempre novas formas de dar aula e poder assim, tratar todos os nossos alunos, com o devido respeito.”

Fale sobre a proposta central do projeto, em questões de desenvolvimento, e como você se sente fazendo a diferença na vida de tanta gente.
Oficina com Bruno Graveto, baterista da banda Calirock (ex-Charlie Brown Jr) com a aluna Cibele e Paul Lafontaine | Foto: Ilana Bar

“A nossa proposta central é dar oportunidade para pessoas com deficiência de terem aulas de bateria, e assim, consequentemente com as aulas, nossos alunos irão trabalhar várias questões de desenvolvimento como: apuração sensorial, melhoria na concentração e coordenação, fortalecimento da autoestima, aumento da criatividade, estimulação do lado artístico, socialização, prazer e satisfação pessoal.

Eu fico muito orgulhoso quando sinto que faço a diferença na vida dos meus alunos e quando eu vejo que eles estão realizando um sonho ao tocar bateria! Sinto também uma gratidão enorme quando vejo que, com muita persistência, consegui dar enormes passos para o fortalecimento da proposta do Alma de Batera. Ver todas essas pessoas que estão tocando bateria, estão se sentindo de alguma forma preenchidos e realizados! Sem dúvida nenhuma, eu tenho muita sorte de ter um trabalho que só traz alegria, pra mim e para meus alunos!”

A ideia de criar o Alma de Batera, unindo sua paixão pela bateria com a questão da inclusão, surgiu de forma quase que inesperada, e rende uma história incrível. Que relembrar e contar aos leitores aqui do blog Casadaptada?

“Sim! Eu sempre falo que o Alma de Batera surgiu sem querer. Nunca havia pensado em ser professor de bateria e muito menos em planejar dar aulas para pessoas com deficiência. Em 2007, fiz alguns trabalhos voluntários na Fundação Dorina Nowill para cegos e na equoterapia da Hípica de Santo Amaro, e foi dali que surgiu minha vontade de trabalhar na área.

Voltei a estudar, ingressando na faculdade de pedagogia, e meu objetivo era conseguir alguma vaga como estagiário em alguma instituição tradicional no universo da inclusão. Mandei muitos currículos e ninguém me respondeu. Foi aí que o destino me apresentou uma oportunidade: ligaram no estúdio do meu professor de bateria na época, o Vitor Lambert, e precisavam de alguém para dar aulas para quatro alunos, todos eles com alguma deficiência. O Vitor na hora me indicou pois ele já sabia que eu queria trabalhar com esse público. De quatro alunos, no final do ano já eram nove. Com isso, percebi que faltavam professores de bateria para atender pessoas com alguma deficiência e que existia uma demanda enorme de interessados. E assim, surgiu o Alma de Batera!”

Aproveito a liberdade jornalística e darei um “Ctrl C + Ctrl V” (risos) da nossa primeira entrevista ao site Batera, para mostrar porque você escolheu o nome: Alma de Batera.
Para ajudar acesse: http://vaka.me/883811

“Busquei um nome que representasse bem tudo que os alunos são quando estão tocando bateria. Envolve uma enorme paixão pelo instrumento, um sentimento que muitas das vezes não tem como explicar. É algo que nasce dentro da gente e que todo baterista, independentemente de sua condição, sabe do que estou falando. Está na alma.”

Por fim, é necessário lembrar que qualquer pessoa pode ajudar e contribuir com a campanha de “Reforma do Espaço Alma de Batera”. Para isso, basta acessar o site Vakinha.com.br, e escolher o valor da contribuição, clicando aqui.

Mais informações:

almadebatera.org.br

www.youtube.com/almadebatera

twitter.com/almadebatera

www.instagram.com/almadebatera

www.facebook.com/AlmaDeBateraOficial

Link da campanha:

www.vakinha.com.br/vaquinha/espaco-alma-de-batera-reforma-paul-georges-lafontaine

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