Pais acreditam que filho era amarrado há mais de um ano em creche no Rio
Diretora da creche diz que cadeira é indicada por associação de reabilitação.
Vídeo do menino amarrado foi divulgado pelo colunista Ancelmo Gois.
Os pais de um menino de 4 anos gravaram um vídeo em que o filho aparece amarrado a uma cadeira na Escola Creche Sonho Meu, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio. As imagens foram feitas no dia 23 de fevereiro e divulgadas pelo colunista Ancelmo Gois nesta quarta-feira (22). Segundo o advogado da família, Walter Barcellos Duque, fotos que serão inseridas no processo mostram que a criança era amarrada há pelo menos um ano e meio.
“Nós temos fotos que mostram que antes de ele ser amarrado na cadeira, ele ficava amarrado no carrinho de bebê, com as pessoas da creche em volta”, afirmou o advogado.
(Foto: Reprodução/Boletim de ocorrência)
O pai do menino, Marcelo Henrique Gomes, diz ter recebido a primeira denúncia de uma ex-professora da instituição. Ela teria contado aos pais que a criança era frequentemente amarrada. Para verificar a veracidade da informação, eles deixaram o menino na creche e, depois de 20 minutos, retornaram e fizeram o flagrante. Posteriormente, outras funcionárias e ex-funcionárias procuraram os pais para dar mais detalhes, segundo eles.
A criança, segundo relatos do boletim de ocorrência, tem atraso global no desenvolvimento psicomotor e a inserção do menino na escola foi uma recomendação médica. De acordo com o pai, a criança é acompanhada por um neurologista e fonoaudiólogo. O caso foi registrado como maus tratos.
Segundo Duque, a professora informou ao responsável que a criança estava amarrada para fazer a refeição. Porém, nas imagens é possível ver que ele não estava comendo nada. Já as outras crianças aparecem brincando e outras se alimentando.
A família registrou o caso no dia 25 de fevereiro. De acordo com a Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV), as imagens foram analisadas e testemunhas ouvidas. A diretora e funcionários da creche prestaram depoimento. O caso foi encaminhado ao Juizado Especial Criminal (Jecrim).
“Eu não tenho como acusar ninguém de nada, eu fiz uma denúncia”, afirmou o pai da criança.
Segundo o advogado, os pais divulgaram as imagens, pois estão preocupados com o bem estar das outras crianças. “Se foram capazes de fazer isso (com o menino), podem fazer isso com outras. Eles quiseram tornar público o tipo de tratamento que essa creche vem dando as crianças. E eles querem investigar quais efeitos esse tipo de tratamento teve no filho”, afirmou Duque.
Denúncias teriam partido de 5 funcionárias e ex-funcionárias
À tarde, os pais do menino G, de 4 anos, que teria sofrido maus-tratos na creche Sonho Meu, em Jacarepaguá, disseram em entrevista que após o flagrante feito pelo pai, outras duas ex-funcionárias e duas funcionárias da escola confirmaram que o menino ficava amarrado na cadeira.
Segundo a mãe, a primeira denúncia foi de uma professora que a abordou no dia 23 de fevereiro quanto ela foi buscar o filho na escola. “Ela me abordou e disse que precisava me contar uma coisa sobre o meu filho. Elas disseram que ele ficava amarrado a maior parte do tempo e que no baile de carnaval ele estava amarrado”. Ela contou que se surpreendeu e questionou a professora. “Qual a justificativa que ela usa [direção] para amarrar uma criança. Eu nunca ia permitir. Ela me disse que ele era agitado e o colégio não tinha gente suficiente para atender o número de crianças. Disse que a primeira vez que fez isso foi quando ele estava no refeitório nessa cadeira.”.
O pai disse que nunca tinha suspeitado sobre o procedimento da escola. Ele explicou como fez o flagrante. “Quando veio essa notícia, nós fomos buscar. Vamos tentar ver o que acontece. Deixamos ele na escola e 15 minutos depois entrei para filmar”, disse.
Segundo ele, a dona da escola teria dito que o menino precisaria de limites.
Diretora diz que uso é regular
De acordo com a diretora da creche Sônia Maria Cabral de Almeida, o uso da cadeira não é irregular. “Essa cadeira não é nada irregular, é uma cadeira que foi indicada pela Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR) para crianças especiais ou com algum problema, mesmo sem diagnóstico fechado, mas que tenha uma necessidade especial. Ele nunca ficou sentado nessa cadeira, ele só ficou nessa cadeira com minha autorização em 12 de fevereiro. Foi o dia de baile de carnaval da escola e as crianças encontravam-se muito agitadas e eu pedi ‘vamos pegar a cadeira e vamos deixar o Guilherme sentado para o almoço’”, afirmou.
De acordo com a ABBR, a cadeira não é indicada para todos os tipos de crianças com necessidades especiais e sim nos casos onde a criança não apresenta controle postural suficiente para permanecer na postura sentada.
A professora Conceição negou que fosse uma pratica da escola deixar o menino amarrado na cadeira de contenção. “Nunca ele ficou dessa forma. Só aconteceu na hora do lanche porque ele não se alimenta direito. A gente usava essa cadeirinha que é modelo para dar alimentação. Era para proteger”, afirmou a professora, que tem 35 anos de magistério e trabalha há cinco anos na creche.
Segundo o advogado da família, a criança foi retirada da creche e transferida para uma instituição municipal após o flagrante.
“Ele está agora numa escola municipal e a evolução nos últimos meses tem sido muito boa, ele está socializando muito melhor. Essas imagens mostram que eles não têm a menor condição de tratar com crianças nesta escola”, afirmou.
(Foto: Kathia Mello/G1)
Diretora tem apoio de outros pais
Vários pais de alunos enviaram mensagens e ligaram para a escola. Alguns foram pessoalmente até o colégio na manhã desta quarta-feira (22), após a divulgação do vídeo. O comerciante Clodoaldo de Lima, disse que tem um filho na escola há cinco anos e ficou surpreso com a notícia. “Minha filha conta tudo que acontece na escola e nunca relatou nada”, disse
Livia Ribeiro, foi estagiária do colégio e tem um irmão que foi ex-aluno.”Ele foi o primeiro aluno. Entrou com seis meses e ficou seis anos. Eu estou achando tudo um mal entendido. Quando fiz estágio tinha crianças especiais e não houve nenhum problema. Pelo contrário, crianças sempre bem tratadas”, afirmou Lívia Ribeiro.
Fonte G1